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segunda-feira, 22 de outubro de 2012

O Aniversário de Iolanda - Uma Década Paulistana: do Porto de Santos à Hospedaria do Imigrante

RJ, 21/10/2012
Autora: Marta Caetetu
O Aniversário de Iolanda

(...)

Parte IV
Uma Década Paulistana

Naquele ano de 1940, Lucien Duby, jornalista francês sexagenário, que chegou ao Brasil no ano da comemoração do 10° Aniversário da Proclamação da República, com 25 anos de idade, era o contato do grupo que lutara na Espanha e que se dispusera a receber Felipe e Beatriz. 

O casal e as crianças estavam a bordo do navio que cruzava o Atlântico e atracava no Porto da Cidade de Santos, em São Paulo. Embarcados, imigrantes de diferentes partes da Europa, chegavam ao país para trabalhar, fundamentalmente, no setor agrícola. Felipe e Beatriz faziam parte de um pequeno grupo de exceção, porque os vínculos e ou contatos no Brasil eram ligados a setores como a indústria, a imprensa ou o teatro. O casal López ingressaria no Jornal A Gazeta, jornal paulistano, fundado em 1906 e um dos mais importantes do país, no século XX.
Depois de 29 dias e treze horas de viagem, Lucien, segurando um cartaz*, aguardava ser identificado por Felipe e Beatriz. 
Ao se aproximarem, Lucien, visivelmente, tão emocionado quanto o jovem casal, que lutara contra a  direita espanhola, abraçou as crianças:

__ Sejam muito bem-vindos, mes enfants!  

Estação da Luz
Felipe e Beatriz choravam como se despejassem toda a tristeza testemunhada nos anos de guerra. Abraçados, buscavam na memória os momentos com Henrique e Dolores...
Logo após, Lucien retirou-se rapidamente, porque o fato de estar ali, fora uma concessão, de próprio punho, do então Presidente Getúlio Vargas.
Ao desembarcar, os imigrantes eram conduzidos, diretamente, para o trem com destino à Estação da Luz, na Cidade de São Paulo, cuja plataforma era a porta de entrada para a Hospedaria do Imigrante, inaugurada em 1885, no bairro do Brás. 
Na Hospedaria, faziam a primeira refeição em terra firme e, caso necessário, recebiam cuidados médicos imediatos. Depois, eram conduzidos aos dormitórios. No dia seguinte, no início da manhã, acontecia a  verificação de documentos e condições de saúde; recebiam um "cartão de rancho" garantindo sua   permanência, ali,  por seis dias. O prazo era ampliado nos casos constatados de comprometimento clínico, destacadamente, quadros infectocontagiosos.
Além disso, o imigrante assinava contrato de trabalho na  Agência Oficial de Colonização e Trabalho - prédio anexo à Hospedaria



Felipe, Beatriz e as crianças ficaram dois dias na Hospedaria
Lucien, que já havia preparado sua casa, no bairro Jardim Paulista, dirige rumo à terra firme, que abriga seus novos amigos.  
Passados três anos, os espanhóis, como eram, carinhosamente, chamados por Lucien, já moravam em sua própria casa, comprada com a ajuda do francês.
A amizade entre eles crescia com o passar do tempo e Lucien, que não tinha parente algum no Brasil, era solteiro e praticante do exercício intelectual, adotara a pequena família espanhola.
Nas conversas mais longas, Henrique e Dolores eram lembrados. Passados mais de cinco anos, o Governo de Franco não fornecera qualquer informação a respeito da morte do casal, após prisão e tortura.
No inverno de 1949, aos 75 anos,  Lucien faleceu. Em seu testamento, os espanhóis foram subscritos como seus herdeiros.
Uma vez mais, a dor dilacerava a alma de Felipe e Beatriz; Maria Antônia e Francisco também ficaram bastante abalados; passaram uns três dias em casa, brincando apenas com Íris, filha de Bernadette, empregada de Lucien por mais de trinta anos. 
Com a ausência do grande amigo, a mudança de ares era uma questão imediata.
Beatriz conversou com Bernadette a respeito da mudança e do desejo de Íris em estudar medicina.
__ Querida Bernadette, eu e meu esposo resolvemos que a hora de partir, chegou. Decidimos nos mudar para a Capital Federal e ficaríamos felizes e honrados se você e sua filha fossem conosco; formando uma família especial, uma família franco-espanhola.

__ Agradeço, dona Beatriz.

__ Por favor, Bernadette, somente Beatriz.

__ Levando em conta, que ficaremos juntos, creio que Íris  ficará radiante.

__ E você?

Então, Bernadette deu um longo abraço em Beatriz.

Em uma bela manhã de primavera de 1949, despediram-se das recordações paulistanas e viajaram para o Rio de Janeiro.


*Estava escrito assim: Espanhóis, o amigo francês está feliz. O "anúncio" da placa foi combinado com o grupo que estava lutando na Espanha.

(...) 

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